[Resenha] Grande Irmão, Lionel Shriver
Sinopse: Pandora é uma empreendedora bem-sucedida que vive em Iowa com o marido, Fletcher, um homem de temperamento irritadiço, que nunca consegue relaxar. Edison, irmão de Pandora, antes um conhecido pianista de jazz em Nova York, está completamente falido, sem ter onde morar. Contrariando o marido, Pandora envia uma passagem aérea para o irmão e abre sua casa para hospedá-lo. Depois de quatro anos sem se encontrarem, ela quase não o reconhece quando vai buscá-lo no aeroporto e depara com um homem mais de cem quilos acima do peso. Em casa, os hábitos desleixados de Edison criam um enorme desconforto para Fletcher, até que Pandora decide se comprometer com o emagrecimento do irmão e abdica de tudo para ajudá-lo. Construído com a inteligência e a força impactante de Lionel Shriver, Grande irmão é um livro sobre um assunto ao mesmo tempo social e dolorosamente íntimo. Shriver mostra, sem rodeios, como
a obesidade grave pode atingir uma família de modo devastador e nos faz questionar se é possível proteger as pessoas que amamos delas mesmas.
Drama | 336 páginas | Avaliação 5/5
Com o mesmo estilo de sempre, Lionel Shriver, autora de Precisamos Falar Sobre o Kevin, nos leva a um universo crítico, incômodo e ácido ao abordar a obesidade como tema central em Grande Irmão. Preparem-se leitores, pois não posso escrever pouco quando se trata da magnífica Lionel.
O fracasso permite a libertação.
O livro é narrado por Pandora, uma empresária bem sucedida que mora em Iowa nos Estados Unidos com seu marido Fletcher e dois enteados: Tanner e Cody. De um dia para outro descobre por Slack, um amigo de seu irmão mais velho Edison, que o mesmo está passando por uma situação difícil em Nova York. Apesar dos protestos de Fletcher, Pandora o chama para morar com eles quatro por um tempo até as coisas se normalizarem para o lado dele. O problema (problemão) que a pegou de surpresa foi quando se dirigiu ao aeroporto para recebê-lo. Notou que o irmão havia engordado radicalmente nesses quatro anos em que os dois não se encontraram. Foi um pouco constrangedor o momento, pois ela teve que ignorar a circunstância mostrando-se educada.
O simples fato de fitá-lo parecia maldade.
Para o espanto de Fletcher, seu cunhado (Edison) passara mais tempo que desejara em sua casa. Os hábitos tão comuns para Edison gerava vasto ceticismo em Fletcher, criando uma barreira entre a transparência e a hipocrisia. Além disso, Pandora e sua família estavam desenvolvendo os mesmos hábitos de Edison, mesmo sem querer. No fundo, a mulher sabia que ninguém estava sendo sincero com ninguém, pois ao invés dela ativar seu conteúdo sincero afetivo, fingia que não havia nada de errado.
Ele adora cuspir informações e não era mau contador de histórias. Mas era capaz de falar o dia inteiro sem que, no final, alguém o conhecesse melhor do que antes.
Sentir fome quando se está com excesso de peso é uma forma nitidamente burguesa de sofrimento, quando ninguém mais tem pena de nós, é difícil termos pena de nós mesmos.
Fletcher já havia exteriorizado várias vezes sua falta de complacência mediante a situação presente. Essa palavra, dentre todas usadas no livro, a “autocomiseração”, que significa ter pena de si mesmo, é uma das que teve maior destaque e é exatamente assim como Edison se sente, e também sua irmã em relação a ele. O momento em que isso chegou ao extremo foi quando o grande irmão quebrou sem querer uma cadeira feita e carinhosamente apelidada de Bumerangue por Fletcher. A cena em que sucede a humilhação foi algo que Lionel transmitiu com muita destreza. Foi algo forte que dispensou compaixão. Fletcher se esbravejou como nunca. Desde o começo, não me simpatizei com ele. Não apenas pelo que fez com Edison. Todos têm vários pontos negativos, e me atrevo a dizer que nenhum personagem me conquistou.
Eu gostaria que ele houvesse pretendido dizer que não queria continuar a se matar de tanto comer. Mas a interpretação alternativa era mais provável: a de que o consumo exagerado e sistemático fosse proposital – um suicídio em câmera lenta, por meio de doces.
Assim, um pouco impensável, Edison aposta com Fletcher comer um bolo inteiro caso ele não emagrecesse. Nessa altura, Fletcher já não queria mais Edison morando lá, e este já queria ir embora também (esse assunto diz respeito a segunda parte do livro intitulada “II : MENOS”). Diante disso, Pandora sentiu comiseração por seu irmão falido e prometeu que moraria com ele em outro lugar por um ano e o ajudaria em sua jornada rumo ao emagrecimento. Ela sabia que estava prestes a arruinar seu casamento, mesmo assim o fez. E Edison, que não se dava bem com Fletcher, se mostrou egoísta deixando a mulher abandonar sua família.
Enquanto nos afastávamos, pensei nesta disparidade: Edison estava apostando o orgulho, Fletcher estava apostando um bolo e eu estava apostando meu casamento.
Pode-se deduzir que os dias que se sucederam não foram nada fáceis para Fletcher, longe da esposa; Edison, tomando shakes e fazendo caminhas; e Pandora, cuidando de um irmão mais velho de 175 K como uma mãe. O que mais me perturbou foi que Pandora e Edison haviam criado uma intimidade de grande proporção. Eles estavam muito ligados. Edison sentia muitos ciúmes de Pandora quando ela saía de casa, como se fosse agora seu dono. Uma vez ela ia se encontrar com seu marido para matar a saudade e chamou Edison para ir junto. A relação não estava nada saudável.
Engraçado, a única coisa que me incomodou um pouco foi ele não ter corrigido a suposição errônea de Novacek de que éramos casados. (Imagino o sorrisinho de Edison ao perceber que Novacek os induziu como casal).
Temos por final um desfecho incrivelmente subversivo, incômodo, maçante, imponderável. Uma história contada por Pandora. Como diz minha vó, foi de arrebentar a boca do balão.
É uma história triste, mas não tem nenhum mistério (E que mistério, hein!).
“Essa era a pergunta do ovo ou da galinha que eu não tinha conseguido dissecar. Edison estava gordo por estar deprimido, ou deprimido por estar gordo?”.
Até a próxima!
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